segunda-feira, 29 de março de 2010

A FOTO EM BRANCO E PRETO

Ah! Como são dolorosas as penas da adolescência.
E que doçura incomparável têm suas alegrias!



A menor de todas as meninas, a última à direita na foto que encontrei entre estes papéis antigos, aquela com expressão desamparada, sou eu. O vestido que trago - muito grande para mim - havia–me sido emprestado da tia Eunice, baixinha como eu, para que eu pudesse comparecer à festa.

Tinha quinze anos quando vim pela primeira vez a Porto Alegre por alguns dias, a fim prestar vestibular para o Curso Normal, que a pequena cidade do interior, onde eu morava, não oferecia.
Foi gentil da parte da amiga de minha prima - de quem eu era hóspede - ter-me convidado para a festa de seus dezoito anos. Teria preferido ficar em casa, ainda que sozinha, mas a insistência da tia Eunice – que praticamente me obrigou - impediu-me recusar o convite. Além do mais, não havia trazido roupas e sapatos próprios, pois não esperava nenhum convite.

Na festa – ainda a vejo como se fosse hoje –, a música e uma mescla de perfumes espalham-se pelo ar. As meninas riem alto e falam todas ao mesmo tempo, naquela cumplicidade de quem convive diariamente na escola, nas festas e nas matinées. Empurram-se, apertam-se, trocam de lugar, fazem pose para o fotógrafo.
Finalmente, termina a prolongada, porém bendita sessão de fotos. Digo bendita já que durante ela sou poupada de participar das conversas. Acaba, para meu pesar, pois agora começa o baile e eu não sei dançar. Além disso, sou tímida demais. Até desisti das aulas de piano por não conseguir me apresentar em público, como aconteceu no recital de fim de ano da escola. Momentos antes de ser anunciada minha peça, tão duramente ensaiada, fugi para o banheiro onde fiquei chorando, num misto de desejo de tocar e raiva de mim mesma pela falta de coragem.
Sento-me num canto afastado, olhos cravados no chão. Encolho-me o mais que posso para passar despercebida. Cruzo os pés e tento escondê-los debaixo do sofá. Estou com os únicos sapatos que trouxe: aqueles pretos do uniforme do colégio, pois ninguém lembrou de me oferecer outros mais adequados e eu não tive coragem de pedir. Seguro um copo de refrigerante, que não pretendo largar, certa de que, enquanto estiver com ele na mão, ninguém me convidará para dançar. Mas é improvável que alguém queira dançar comigo dada minha triste figura.
“Vamos dançar?” Ergo os olhos para o rapaz parado na minha frente. “Desculpe”, respondo, “mas eu não sei.” ”Eu também não”, diz ele, sorrindo, “mas quem sabe a gente tenta?”. Não tendo mais o que argumentar, levanto-me e nos dirigimos ao centro da sala. Ele coloca os braços à minha volta e eu tento seguir seus passos. Desajeitada a princípio, aos poucos vou ganhando confiança. Afinal, boleros e sambas-canção não são tão difíceis de acompanhar. E ele, ao contrário do que me disse, sabe dançar! É alto, moreno e tem o mais lindo sorriso que já vi. Diz que também é do interior, veio a Porto Alegre para o aniversário da amiga e que meu ar sério e jeito reservado chamaram sua atenção. Conversamos muito, ele dança só comigo e, a certa altura, para mim não existe ninguém mais na sala além de nós dois. Ao final da noite, estou perdidamente apaixonada. Terminada a festa, ao nos despedirmos, pede meu endereço, fica de escrever.

A carta nunca chegou.

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